TEREZA CRUVINEL - Quando o Governo elevou a previsão de déficit fiscal para este ano, dos R$ 96,6 bilhões estimados no governo Dilma, para R$ 170,5 bilhões, não faltou quem desconfiasse de que se estava era criando um espaço para acomodar um crescimento do gasto, no curso da guerra política para consumar o “golpeachment” e garantir a efetivação de Temer. Setores do mercado, oposição, analistas, não faltou quem suspeitasse do que vem se confirmando a cada dia: como se não houve crise, e apesar do discurso da austeridade, o governo abre o cofre e distribui bondades: premia governadores, concede aumentos a funcionários, aumenta o Bolsa Família...
Esta contradição foi o que azedou o vinho do jantar de terça-feira à noite entre senadores governistas e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Se o país está à beira do precipício, o governo deve ser contrário aos aumentos de salários que tramitam no Congresso, e que terão um impacto de R$ 67,7 bilhões até 2019, questionaram alguns. Com mais ênfase, o tucano Tasso Jereissati e o demista Ronaldo Caiado cobraram de Meirelles uma orientação clara aos aliados, a favor ou contra as propostas. Meirelles evitou o sim e o não, muito pelo contrário, saiu pela tangente, decepcionando também por isso os comensais, que esperavam ouvir mais sobre os rumos econômicos do governo. Outro que pegou pesado foi o peemedebista Jader Barbalho, ao perguntar a Meirelles qual era o “limite da irresponsabilidade” a que poderiam chegar os aliados na votação dos aumentos.
O do Judiciário, que será votado pelo Senado nesta quarta-feira, custará R$ 1,7 bilhão só este ano. Mas como contrariar o Judiciário numa hora destas, na reta final do impeachment e com a Lava Jato rondando figuras do governo? Padilha, chefe da Casa Civil, defendeu a aprovação e, pela primeira vez, fez um elogio ao governo Dilma, que a seu ver fez “uma boa negociação”. Dilma vetou aumento maior aprovado pelo Congresso e negociou com o Judiciário o aumento menor, que está em pauta.
Mas a gastança em curso, ancorada do déficit ampliado, não se restringe a reajustes salariais. Até agora, tudo o que foi feito para cortar gastos foi perfumaria diante da neo-gastança: redução de ministérios e corte de cargos comissionados, por exemplo. O famigerado teto para o gasto público segue em pauta, mas por ora é apenas um discurso. Se for aprovado, será por emenda constitucional, terá efeitos terríveis mas valerá só a partir do ano que vem. Aí, já terá passado a hora do golpe, e os gastos para aliciar apoios já terão sido feitos. Por ora, o Governo está é ampliando o gasto, em níveis que segundo alguns analistas vão estourar o déficit previsto. Mas quando isso acontecer, culpe-se o governo anterior.
Nas últimas semanas, só com a carência para os governos estaduais devedores o governo comprometeu R$ 50 bilhões, além dos R$ 2 bi exclusivos para o Estado do Rio enfrentar despesas com a Olimpíada. Gastos bloqueados por Dilma, da ordem de R$ 21,2 bilhões, foram liberados. Estão previstos gastos de R$ 9 bilhões com o pagamento de despesas atrasadas do PAC, de R$ 3,5 bilhões com despesas do Ministério da Defesa e de R$ 3 bilhões com a Saúde.
E agora, finalmente, depois das críticas de governistas ao aumento do Bolsa Família que Dilma deixou programado, o que foi chamado de irresponsabilidade, como lembra a ex-ministra Tereza Campelo, vem o governo e concede um aumento ainda maior. Crise? Que crise?
A crise aparece quando é para justificar medidas de cunho essencialmente político. Por exemplo, fechar a EBC, que hoje tem despesas de R$ 45 milhões a descoberto, e não de R$ 90 milhões, como anda dizendo o Planalto. Enquanto espera a melhor hora para golpear a comunicação pública com mudanças ou até extinção da empresa, o governo vai tratando de torná-la irrelevante. Esvazia a TV Brasil, expurgando os profissionais de jornalismo, e até cancela as transmissões de atos presidenciais pela NBR, que conferem transparência ao Governo mas o Planalto considera muito caras.
Haja incongruência!
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