Por Kiko Nogueira - O julgamento do impeachment no Senado ficará marcado indelevelmente não apenas pela farsa em si, mas pelo baixo nível dela, expresso de maneira definitiva na advogada de acusação Janaína Paschoal.
Em seu discurso na terça, 30, depois de um dia em que Dilma passou 14 horas encarando seus “juízes”, inclusive ela, Janaína aproveitou seu instante de brilhareco para constranger até seus aliados.
Messiânica, convencida, como Moro e seu “time”, de que está salvando o país, quiçá o mundo, Janaína invocou o Senhor — aquele mesmo que já tinha aparecido para ela no Largo de São Francisco — e as crianças.
“Eu acho que se tiver alguém fazendo algum tipo de composição neste processo é Deus. Foi Deus que fez com que várias pessoas, ao mesmo tempo, cada uma na sua competência, percebessem o que estava acontecendo com nosso país e conferisse a essas pessoas coragem para se levantarem e fazerem alguma coisa a respeito”, disse.
“Quero o povo brasileiro com o coração tranquilo, que sinta que isso aqui é necessário”, prosseguiu. “Eu peço desculpas porque eu sei que, muito embora esse não fosse o meu objetivo, eu lhe causei sofrimento [a Dilma]. E eu peço que ela, um dia, entenda que eu fiz isso pensando, também, nos netos dela”.
E chorou.
Não há canalha maior do que o canalha que arrota superioridade moral, o sujeito que espanca alguém enquanto sussurra que é para seu bem.
Se Janaína traz alguma novidade ao debate é a constatação triste de que avançamos de maneira irreparavelmente em direção ao passado. O traço medieval do golpe é a cereja do bolo.
Da Inquisição ao Estado Islâmico, do pastor Malafaia a George W. Bush, passando por Charles Manson e Chico Picadinho — todo fanático acha que está realizando a obra do Altíssimo.
Não foi Jesus Cristo quem pagou 45 mil reais para Janaína Paschoal produzir o parecer que fundamentou a denúncia. Em abril, confrontada por Vanessa Grazziotin na comissão do impedimento no Senado, Janaína contou: “Eu fui contratada pelo PSDB em maio. Nós propusemos o processo em setembro. Recebi 45 mil reais para fazer o parecer”.
Os cidadãos indignados que atenderam a um chamado divino, como os rapazes do MBL, foram financiados pelo PMDB, PSDB, DEM e Solidariedade.
Miguel Reale Jr., orientador de Janaína, tucano histórico, encomendou o parecer. Ele decidiria, mais tarde, apresentar uma representação ao Ministério Público Federal contra Dilma por crime comum.
Janaína, Hélio Bicudo e Reale Jr acabariam entrando num acordo e apresentando em outubro o pedido de impeachment que seria acolhido pelo anjo Gabriel, disfarçado como Cunha.
Janaína ocupou, por duas vezes, cargos em governos tucanos. No segundo mandato de FHC, foi assessora especial do ministério da Justiça, exonerada em 2002. Atuou ainda na gestão de Geraldo Alckmin como assessora técnica de gabinete do governo.
Em março, declarou à BBC Brasil: “Entre a primeira intenção e a conversa com Hélio Bicudo foram três meses, depois de falar com muita gente. Falei sobre o tema na OAB de São Paulo, onde sou conselheira, e também com professores de direito e colegas advogados. Até o PSDB eu procurei, mas ninguém se habilitava”.
No início de “Mein Kampf”, Hitler escreveu: “Eu acredito que hoje minha conduta está em acordo com o desejo do Criador Todo Poderoso”. Deu no que deu.
Se Deus existisse, já teria processado todo esse pessoal.
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