Revista Fórum - O que era para ser uma audiência pública com professores e estudantes na Comissão de Educação do Senado, hoje (1º), terminou se transformando num grande ato de protesto contra o senador Cristovam Buarque (PPS-DF) pelo voto que ele deu em favor do impeachment de Dilma Rousseff, ontem (31). Buarque, que é integrante da comissão, foi reitor da Universidade de Brasília (UnB) e é professor universitário, contando com boa parte da sua base eleitoral na área acadêmica. Ele tentou disfarçar o constrangimento, dizendo que estava indignado com a injustiça e o cerceamento do seu direito de se manifestar, mas terminou encerrando a audiência pouco tempo depois de ser iniciada.
A sala da comissão foi invadida, mesmo antes do início da audiência pública, por alunos da rede de ensino do Distrito Federal (DF) e professores com faixas e cartazes de “Traidor” e “Golpista” dirigidas ao senador – que já foi ministro da Educação no governo de Luiz Inácio Lula da Silva e governador do DF pelo PT. Ao perceber que não poderia discorrer sobre o tema em meio aos gritos, o senador afirmou que o que estava sendo observado naquele momento era “a impossibilidade de o professor que estava com a palavra falar”.
“Fiquei nove anos fora do Brasil, não é fácil ficar no exílio, porque não queria conviver num país que tinha golpista. Se esses meninos acham que aqui tem golpista, no caso eu, eu respeitosamente suspendo a reunião, pois sou contra reunião dirigida por golpista, mesmo que seja eu”, afirmou ele, ao sair da sala. Com a audiência cancelada, o grupo terminou fazendo uma pequena passeata pelos corredores do Senado, gritando também frases como “Fora Temer”, “Senadores golpistas” e “Cristovam traidor”.
O texto em questão, o Projeto de Lei do Senado (PLS) 193/2016, apresentado pelo senador Magno Malta (PR-ES), tem a proposta de “prevenir o abuso na liberdade de ensinar do professor, em prejuízo da liberdade de crença e consciência do aluno”, segundo explicou o idealizador do texto, o professor Miguel Nagib, presidente da Organização Não-governamental (ONG) Escola Sem Partido.
A estudante Taís Soares, da União dos Estudantes Secundaristas do Distrito Federal (UES-DF), disse que o protesto foi uma forma de os estudantes defenderem seus direitos e que o fato de terem se mobilizado não deveria ter feito diferença, uma vez que todos sabem da forma como Cristovam Buarque se posicionou na votação do impeachment.
“O que o senador ouviu aqui, ele poderia ouvir em qualquer lugar. O objeto da nossa vinda ao Senado não era para fazer protesto, mas nos posicionarmos em relação a ele e, também, para participar do debate sobre a proposta legislativa em questão. Muita gente faltou à aula para vir até aqui e discutir a matéria, que diz respeito à garantia de nossos direitos enquanto estudantes. Ter cancelado a reunião foi errado e se o senador acha que isso bastou para que os protestos contra ele acabem, que saiba que voltaremos na próxima audiência, para mostrar que somos contra a lei da mordaça”, destacou Taís.
‘Vulnerabilidade do aluno’
No início da audiência, o educador Miguel Nagib ainda chegou a argumentar que o texto, a seu ver, “sistematiza o que já prevê a Constituição, a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Estatuto da Criança e do Adolescente para proteger o estudante” do que chamou de “posturas ideológicas” de professores. “Sejam morais, políticas ou religiosas, reconhecendo a vulnerabilidade do aluno”.
Mas para o representante do Fórum Nacional de Educação (FNE) Toni Reis o projeto consiste numa tentativa de “censura e mordaça” aos professores. Reis contestou as afirmações de Nagib e disse que o texto “não segue as bases da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nem a Constituição Federal”.
Cristovam Buarque disse que é contra a proposta e que não tem simpatia, enquanto educador e parlamentar, “por uma lei que fala em escola sem partido, porque de fato tem uma característica de mordaça, e eu quero uma escola com todos os partidos”. Por outro lado, bem dentro do estilo político que tem adotado nos últimos meses, o parlamentar afirmou que gostou do fato do professor Nagib ter apresentado a ideia, porque considera importante que seja debatida no país.
Buarque destacou que não confia muito no direito exclusivo de que o pai é quem “melhor pode preparar um filho para o mundo”, mas acha que também é importante debater até que ponto a escola pode, para preparar esse estudante melhor, “negar a influência paterna”.
“Nesse sentido, o projeto, que eu não gosto, tem um papel e isso, acho que é uma posição democrática. Eu não gosto dessa ideia, mas acho que o Brasil precisa debater essa ideia”, acrescentou para ter de falar sua fala e encerrar a audiência.
Uma nova audiência pública para tratar do tema será realizada dentro de algumas semanas, segundo a Comissão de Educação.
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